#1 UPon com OPAVIVARÁ! (Brazil)

O prazer como uma força ativadora de espaços públicos. 

data de conversação: 18.11.2022

UPon: O coletivo já vem trabalhando junto há mais de 15 anos. Como vocês diriam que os espaço públicos, seus usos e entendimentos e também o público que os ocupa se transformaram ao longo dos anos que você vêm trabalhando sobre isso? E como seus projetos se adaptaram a essas mudanças?

OPAVIVARÁ!: Acreditamos que o espaço público não é verdadeiramente público. Tem muitas forças que o controlam. Não apenas forças governamentais, mas também forças privadas e corporativas. O espaço público está constantemente em transformação, diferentes forças atuando, diferentes formas de pensar, governos diferentes… No Brasil tivemos uma experiência de muita esperança em 2010, particularmente no Rio, mas também havia um estranhamento pois sabíamos que tinha a ver com a chegada da copa e das olimpíadas. Tinha muito dinheiro na cidade e muitas transformações em curso mas as mudanças não abarcavam os pobres ou os moradores de rua ou os moradores do centro da cidade, da região portuária e todos esses locais que sofreram profundas reformas, como aconteceu em muitos lugares do mundo também, aqui o projeto foi chamado de Porto Maravilha, porque é cidade maravilhosa e tudo era feito pra parecer muito bonito. Para esse projeto de aparências muitas escolas de samba instaladas nessa região fecharam suas sedes, pessoas sofreram remoções e prédios históricos foram derrubados pra construírem torres empresariais em seus lugares. Nós observamos todo esse processo e fizemos trabalhos sobre essa situação como DESVENDA-SE, que tem o duplo sentido de ser uma venda que se desfaz e algo que se revela com a retirada de uma venda dos olhos: você desfaz uma venda e a enxerga com novos olhos. Nós levamos vários cartazes para essa área portuária, na tentativa de levantar questões sobre essas mudanças na cidade e a quem elas atendiam.

Gostamos de pensar em como nossos trabalhos podem provocar mudanças e transformações reais e temos um exemplo particular de uma praça no centro do Rio, onde fizemos várias ações ao longo dos anos. Ela estava toda gradeada e depois que instalamos escadas no seu entorno para que as pessoas pudessem atravessá-la, houve uma renovação urbanística que removeu as grades. (PULACERCA) Agora, as pessoas já podiam atravessar a praça, mas ainda assim ela era desértica e quente e faltavam árvores e sombra, então propusemos uma cozinha que disponibilizasse água e comida. É uma ideia de pensar como os espaços públicos e arte nesses espaços podem se diferenciar dos monumentos e estátuas e essas coisas de pedras sólidas. Por outro lado estamos longe ainda da discussão a nível governamental. Alguns anos atrás o governo criou uma comunidade para discutir arte no espaço público. Nós ou outras pessoas que pensam de forma similar, não estávamos lá e portanto todas as coisas em torno do espaço público eram novamente sobre estátuas e monumentos. Temos agora muitas estátuas de personalidades importantes nas ruas.

UPon: Muitos dos seus projetos são colagens de diversos elementos concebidos para uso individuas, como por exemplo a “colagem” de cadeiras; a cadeira é individual mas vocês “colam” umas às outras, ou a costura de redes e bicicletas… vocês estão fundindo o individual e o coletivo. Como vocês enxergam essa relação entre o individual e o coletivo no espaço urbano?

OPAVIVARÁ!: talvez essa técnica da colagem ou “agregação” que coloca objetos individuais juntos dando um uso coletivo é a que mais utilizamos. Por exemplo os TRANSNÔMADES é uma escada, uma pia, um garrafão e uma cadeira de rodas colocadas juntas, criando um sistema que cria uma pia e um chuveiro e essa colagem gera um sentido de coletividade e comunitarismo à esse objeto. Mas outra coisa muito importante é que ele seja utilizado. Pensar sobre os espaços públicos em áreas urbanas é uma questão e um problema. Às vezes, especialmente aqui no Rio, o espaço público não é feito pra ser ocupado. Você apenas o atravessa. A praia é um pouco diferente, é um espaço onde as pessoas permanecem, mas isso porque está associado a outros prazeres. As praças são feitas para os monumentos. Você coloca lá o monumento no meio da praça e tá tudo certo, você não precisa criar um ambiente que atraia uma coletividade para dar vida à essa parte da cidade. E é isso que nós tentamos fazer isso, criar um ambiente envolvente. Gostamos de dizer que não existem espaços públicos e sim momentos públicos, que se criam a partir do estar junto no espaço público. Mas estar coletivamente nos espaços públicos é uma luta pois há uma série de coisas que interrompem esses agrupamentos. Com os nossos trabalhos estamos tentando criar essas colagens e a ideia de coletivismo para reunir as pessoas, e convidá-las a serem parte deste coletivo expandido. E como sempre nos nossos trabalhos, o prazer é uma coisa muito importante. Às vezes a cidade é um lugar muito enrijecido para se viver. A cidade é feia, suja, não te acolhe, por isso criamos situações para acolher as pessoas e as convidar a experimentar a cidade coletivamente com prazer.

UPon: Observamos que o seu trabalho se relaciona com a ideia de subverter as regras, as normas de uso do espaço público, contestando essas regras, descobrindo novas regras ou hábitos dos espaços públicos. Vocês trabalham sobretudo nos espaços urbanos brasileiros mas também vêm realizando projetos na Europa. Talvez vocês possam fazem uma comparação dessas experiências, sobre como é trazer seus projetos para o contexto Europeu. O que vocês observam, quais são as diferenças, quais práticas são melhor traduzidas ou se encaixam melhor aos contextos que não são conhecidos, por exemplo.

OPAVIVARÁ!: Alguns projetos são bem fáceis de trazer pra Europa ou qualquer outro contexto, quando eles falam de relações públicas e coletivas e não sobre um contexto específico, como por exemplo a REDE SOCIAL, que em português é a mesma palavra que define as redes sociais virtuais. Nós criamos essa obra costurando várias redes juntas e as pessoas podem desfrutá-las juntas, compartilhando o espaço e dialogando e negociando sobre como querem utilizá-la, por exemplo se querem sacudir ou não. Quando levamos essa obra pra Inglaterra foi muito fácil fazer com que as pessoas a ativassem. Mesmo com o estranhamento do objeto rapidamente há uma compreensão de como utilizá-lo. Quando as questões são sobre coletividade é muito fácil se adaptarem a qualquer circunstância. Pois se trata de uma luta humana e não uma luta em particular de um determinado local. Estamos todos vivendo em sociedade, vivendo juntos, tendo que negociar como vamos dividir e compartilhar os limites e as fronteiras. É sobre isso o projeto e por isso fácil de ser compreendido por todes.

Outros projetos já são um pouco mais complexos, como essa obra que chamamos de TRANSNÔMADES. Já a realizamos em Frankfurt, Nyon e Lisboa. Nós criamos uma colagem que é uma espécie de cozinha móvel. Por exemplo, um carrinho de supermercado que vira churrasqueira, um carrinho de bebê karaokê e uma cadeira de rodas bar que podemos levar pra qualquer parte, como uma espécie de acampamento móvel. Nós pensamos muito sobre a situação dos refugiados ao fazer essa obra. Como criar uma possibilidade de acampar, ocupar e se mover pela cidade com comida, abrigo, água? Foi uma forma de traduzir uma determinada experiência no Brasil, mais ligadas aos moradores de rua, para o contexto Europeu, dos refugiados. Mesmo trabalhando com instituições na Europa e acessando alguns refugiados, a diferença é que no Brasil rapidamente as pessoas identificam que a estrutura é feita para ser usada pois esse tipo de colagem e improviso é comum aqui, chamamos de gambiarra. Já na Europa essas estruturas são vistas com um certo exoticismo e as pessoas não se sentem à vontade para interagir ou reconhecem de forma mais imediata que se trata de um objeto de arte que não é feito pra ser tocado… É mais fácil no Brasil colocar as pessoas em contato com a obra, pela falta desse filtro…

UPon: Nos seus projetos vocês propõe situações fora do habitual para os espaços públicos e criam encontros para passarmos mais tempo junto com pessoas que não fazem parte dos nossos círculos de convívio, apenas propondo estar no mesmo lugar ao mesmo tempo. Qual é o papel dessas intervenções? Vocês são visíveis, estão apenas moderando ou convidam as pessoas a participarem e ver o que acontece, deixando o momento coletivo se desenvolver do jeito que for?

OPAVIVARÁ!: Acreditamos que o trabalho está de fato acontecendo quando já não precisamos mais ativá-lo. Quando podemos nos distanciar e observar a cena e as pessoas que se apoderaram da ação, que elas de fato compreenderam o funcionamento e estão disfrutando das obras. Dá muito trabalho pra termos prazer! (risos) A gente trabalha muito pra criar esses objetos. Já fomos criticados por nos considerarem preguiçosos, que só estamos interessados nas coisas prazerosas e que estamos brincando e não fazendo arte séria. Acho que foi em Viena um vez, estava um sol de rachar então encontramos uma pequena área com sombra pra colocar o trabalho. É um comportamento tropical se proteger do sol nas sombras, a não ser que a gente esteja na praia… E então estamos nessa sombra em Viena e recebemos um email no acusando de não estarmos fazendo nosso trabalho direito, de sermos preguiçosos que ficaram descansando na sombra. Foi muito curioso e a mesma coisa que os portugueses diziam dos indígenas quando chegaram aqui. Que os indígenas eram preguiçosos que ficavam o dia todo nas suas redes e não trabalhavam muito.

Falando novamente sobre o prazer como condutor das situações, tem um momento muito icônico pra gente que foi uma ação durante um Carnaval: nós transformamos uma kombi que havia queimado em uma cama e colocamos um sistema de som acoplado. As pessoas tinham que empurrar a cama pois o motor foi retirado mas mantivemos a direção para poder dirigir. E estávamos empurrando o CARRO CAMA pelo Carnaval, gente e música por toda parte, na rua. Num determinado momento chegamos num ponto que pensamos, bom daqui não vai rolar continuar e nos reunimos pra combinar de levar o carro de volta pra garagem. Mas enquanto pensávamos no que fazer a multidão já tinha se apoderado do carro e já estava atravessando a rua, subindo no meio-fi, nos canteiros de grama. O carro subindo e descendo as calçadas. (mostra foto) Olha isso… loucura total. Eu estou aqui no meio da rua tentando abrir o caminho no meio da galera e ninguém sabe mais quem são as pessoas que estão empurrando. Não conhecemos todas essas pessoas, apenas aconteceu. E o carro seguiu por horas e horas e já não estávamos no controle da situação. Foi um momento muito interessante de não ter mais esse controle ou ter que dar a direção da ação.

UPon: A sua prática inclui algum tipo de código para proteger participantes vulneráveis? Vocês já tiveram alguma situação em que não moderar ou não permitir que alguma coisa acontecesse não foi uma boa decisão? Como isso funciona nos seus projetos? Afinal, como colocaram, o espaço público é um lugar difícil, de choque de interesses. E quando junta muita gente pode sempre haver um choque.

OPAVIVARÁ!: Sim, bem, não acho que tenhamos algo parecido com um código de conduta. A maioria das situações de trabalho são improvisadas e acontecem no momento. Trabalhando juntes, por tanto tempo e no espaço público, você começa a entender as situações e como lidar com elas. Mas não temos regras ou algo escrito sobre como nos proteger ou proteger o público. Acreditamos que as pessoas possam chegar a um consenso, que elas não vão destruir os trabalhos ou a elas mesmas. Mesmo quando trabalhamos com coisas perigosas como fogo ou um carro sem freio: situações difíceis e estranhas onde a segurança não é exatamente no que estávamos pensando.. Por sorte nunca tivemos um acidente ou uma situação que tivéssemos que intervir. Acreditamos que os momentos de prazer que criamos, de certa forma nos protegem e trazem as pessoas para perto, pois elas se sentem convidadas. Existem muitos pensamentos sobre arte relacional desde Nicolas Borriaud e o sua Estética Relacional. Temos muitos pensadores sobre essa ideia de arte, mas muitos trabalhos de arte participatória não convidam as pessoas, mas obrigam as pessoas a participarem de certa forma. Com algum tipo de situação bem rígida a ser encarada, às vezes de forma violenta, ou ser de fato obrigado a realizar alguma ação. O que achamos diferente do nosso trabalho é que ninguém é obrigado a estar lá. Entende a diverença? As pessoas são convidadas a estarem lá. É como quando você vai assistir ao teatro e um ator te puxa para dentro da cena e agora você é parte da peça, algumas pessoas ficam em pânico. Nós nunca fazemos isso. Isso não é um código, mas algo que funciona de forma fluida, dependendo da situação.

Quando você está fazendo coisas no espaço público, com pessoas que você não conhece e sem um código de conduta e sem saber o que esperar dos acontecimentos, vocês está colocando seu corpo em risco. Mas achamos que esse risco é válido. É arriscando assim que essas conexões se tornam possíveis. Então não devemos temer. A pandemia nos fez ter medo de arriscar muitas coisas que tínhamos como banais, como sair, encontrar pessoas, se aglomerar em lugares. Foi bem traumático, e como será enfrentar trauma novamente? Como atravessar esse trauma e arriscar novamente? Porque é arriscando que conseguimos mudar algo, achamos.

UPon: Seus últimos trabalhos foram no período pré pandemia. Vocês poderiam nos contar sobre os efeitos da pandemia nos trabalhos de vocês?

OPAVIVARÁ!: Bem, a pandemia foi e ainda é um tempo muito duro para todo mundo. Falando de OPAVIVARÁ! e do nosso trabalho, todas as fotos e vídeos que mostramos: todos os protocolos de higiene não estão lá… quando a pandemia bateu nós tivemos que parar tudo o que estávamos fazendo, porque todos os nossos trabalhos são sobre trazer muitas pessoas para junto. Então, naquele primeiro momento, foi impossível entender como a gente poderia fazer para continuar juntando pessoas. E aí tudo migrou para o online e decidimos que, fora conversas e entrevistas como essa, não faríamos nada online. Não achamos que havia algo para OPAVIVARÁ! fazer no mundo online. Fazemos tudo off-line e de forma low tech. Foi uma decisão sobre esperar para saber o que fazer depois. Precisamos de um tempo. O momento pediu isso. Em 2021 nós fizemos um trabalho, o BEM COMUM que era sobre a água como um bem comum. , foi para uma exposição curada pela Amanda Abi Khalil, Um carrinho com 200 litros de água que levamos pelo centro da cidade e as pessoas podiam pegar água de graça. Durante a pandemia tivemos muitos problemas de falta de água em vários bairros da cidade e especialmente para as pessoas que vivem em situação de rua, água é muito importante para lavar as mãos, beber. Então como manter o distanciamento social, como lavar as mãos se não há água disponível, se não há fontes públicas. Então fizemos esse trabalho, distribuindo água para geral. Foi o único trabalho presencial que conseguimos fazer durante esse período. Agora que as coisas começaram a voltar a alguma normalidade estamos trabalhando, mas principalmente com nosso acervo e repertório de trabalhos antigos. Não estamos mais fazendo trabalhos novos. Não sei por quanto tempo, mas por enquanto estamos participando de exposições com trabalhos antigos e participando de conversas.

UPon: No site do Quartier des Spéctacles de Montreal vocês são descritos como: “Instigadores urbanos de mini utopias”. Vocês podem nos dizer um pouco sobre isso, o que a ideia de utopia representa para o trabalho de vocês?

OPAVIVARÁ!: Bem, podemos dizer que temos muitas ideias utópicas e que pensamos no prazer como um gesto revolucionário. Talvez seja um pouco utópico, não é? Muitos ativismos políticos usam o mesmo vocabulário militar, como, você sabe, avant-garde, luta, batalha, esse vocabulário de guerra e confronto. Porque, claro, às vezes esse é o único caminho. Nós tentamos trazer o prazer pra esse embate adicionando outro vocabulário e práticas que possam mudar espaços e situações políticas a partir de um jeito prazeroso. Isso não quer dizer que seja mais ou menos potente, são apenas outros caminhos para chegar no mesmo objetivo, entrando nas frestas por onde podemos nos infiltrar, e aí criar outra possibilidade de ser. E algumas vezes sim, isso é muito utópico, mas talvez seja melhor pensar em utopia do que distopia, não? Existe um ativista e líder indígena, Ailton Krenak, que também foi membro do congresso nos anos 1980. Logo antes da pandemia ele publicou um livro chamado Ideias Para Adiar o Fim do Mundo. Ele fala muitas coisas que acreditamos estarem conectadas com nosso trabalho. Em um momento ele diz que a humanidade está sempre caindo e que o que temos que fazer é aprender a cair. Ele propõe a criação de paraquedas coloridos para que, pelo menos, a queda fosse mais bonita para todos, colorido e suave. Nós fizemos um trabalho logo antes do livro ser publicado. O Krenak viu o trabalho e disse: “Ah! Vocês fizeram o trabalho por causa do que eu escrevi!”. E não podíamos negar! “Claro! Claro que foi por causa dos paraquedas para tods caírem com cor e beleza”. O trabalho se chama SOLAORCA. OCA é a palavra Tupi para casa seguida de solar. Era uma gigantesca estrutura geodésica coberta por guarda-sóis. Foi para a feira de arte de Dubai. Dá pra imaginar a estranheza que era, porque tudo lá onde era a feira, é construído com aquela mesma cor de deserto e de repente aquele objeto colorido enorme no meio de tudo. É um lugar para entrar e fazer o que quiser. Foi o único lugar da feira que o Sheik não quis entrar na feira, talvez pelas cores. Primeiro a gente queria o objeto com as listras da bandeira LGBT+. Mas conversamos muito com a produção e curadoria e usamos as mesmas cores espalhadas pela estrutura. Mas era bem claro que aquelas cores representavam a diversidade.

Público: Pra nós é sempre uma questão como trabalhar em conjunto com as autoridades. Pensando no trabalho com os chuveiros (CHUVAVERÃO), fiquei pensando se vocês tinham alguma conexão com as autoridades locais? Vocês também realizam trabalhos assim em locais privados ou apenas trabalham sem nenhuma autorização formal.

OPAVIVARÁ!: A gente teve mais dificuldades quando começamos a expor fora da América Latina, Aqui é tudo tão caótico e nós sabemos tirar alguma vantagem disso. Preferimos não pedir autorização para fazer coisas na rua. Apenas fazemos. Muitas vezes as autoridades nem notam que a ação aconteceu. Vocês sabem como é, muitas coisas caóticas acontecem, o caos está presente em todo lugar. Voltando à pergunta sobre os códigos de conduta, apesar de não termos um, uma das ideias é a de que um trabalho de arte no espaço público é bom quando está camuflado. Bem, a SOLAROCA não é uma camuflagem, você pode vê-la de longe, aquele enorme edifício de para sois. Mas todos os outros trabalhos estão no nível da rua. Tivemos muitas situações assim na Europa, porque é mais difícil aí, as regras são mais duras e tudo é mais controlado. Talvez vocês saibam melhor como lidar com essas situações aí para criar momentos prazerosos que possam quebrar essa rigidez e transformar os espaços.

UPon: Vocês falaram muito do passado e do presente. Agora a gente gostaria de conectar com o futuro. Voltando à utopia: Qual a sua utopia particular ou coletiva para o espaço público?

OPAVIVARÁ!: Essa é uma boa pergunta. Acho que devemos nos relacionar com o espaço público com alguma ideia nova, bem diferente de como as cidades têm lidado com isso nesse momento. A maioria das características urbanísticas e ideias arquitetônicas para criar caminhos na cidade deixam as pessoas de fora. Achamos que isso fala muito não só do espaço público, mas de nossas próprias vidas, da quantidade de trabalho, da carga horária, Não existe o direito à preguiça em nosso mundo. E alguma preguiça poderia ser uma meta de utopia, para que a gente trabalhe menos e ganhe mais. Achamos que isso está refletido nesses espaços públicos todos focados na eficiência. Você precisa atravessar a cidade de forma veloz, tudo é sobre eficiência e não sobre prazer, intercâmbio de diversidades culturais e sociais. Tudo é pensando para tornar o mundo um lugar mais lucrativo e esquecemos toda a abundancia que a cidade e o espaço público podem abarcar. Talvez o trabalho de OPAVIVARÁ! Tenha como meta ou sonhe em fazer isso de alguma forma.

Público: Estava pensando na diferença entre trabalhar em uma grande cidade, como vocês fazem, de como há uma certa maneira de como o público reage a algumas coisas ou as respeitam, e trabalhar em contextos menores. Fiquei pensando se vocês já trabalharam em um contexto de uma cidade pequena no Brasil?

OPAVIVARÁ!: Fizemos um trabalho para a Bienal de São Paulo em 2016. Os TRANSNÔMADES. Depois da bienal esse trabalho circulou por cidades menores do país. Fomos para pequenas cidades do sul e do interior de São Paulo. Fomos para Campinas e de alguma forma foi diferente. Como as pessoas interagiram com o trabalho especialmente em  Campinas, foi muito difícil pois é uma cidade muito conservadora. É perto da capital, mas é o último lugar do mundo onde a escravidão foi abolida. Às vezes esse astral conservador de algumas cidades menores torna mais difícil a interação com o público. No entanto, nosso trabalho é bem orgânico, é muito fácil entender o que fazer com um karaokê, com uma cama para deitar, ou com uma churrasqueira. Também achamos pessoas que puderam se relacionar com o trabalho e compreender o que estávamos tentando dizer sobre o espaço público. Mas é um esforço que nós artistas devemos fazer, porque sabemos as dificuldades das cidades pequenas. Como endereçar as questões que são importantes para as pessoas que vivem lá, como as pessoas de lá podem se relacionar com o trabalho e compreendê-lo. É assim que uma ponte pode ser feita. Porque às vezes nós, artistas, chegamos de paraquedas no meio da cidade: “Ok! Vou fazer meu trabalho aqui!”. E de repente você faz algo completamente exótico, alienígena, em relação à vida daquele lugar, do dia-a-dia daquele local. Então achamos que é uma preocupação necessária.

UPon: Obrigado! Sim, talvez seja sobre conectar e também repetir. E talvez essa seja a chave para que esses trabalhos não sejam apenas ações pontuais sem acontecer com uma continuidade, mas também tentando colocar em contato diferentes atores do espaço público. Acho que é sobre criar hábitos de como se mover, como ficar ou parar ou fazer coisas no espaço público que torne possível encontrar com pessoas de forma criativa.   

Talk with OPAVIVARÁ!, Lorène Blanche Goesele, Valeria Schwarz and the popUP-week audience

Transcript editing: Lorène Blanche Goesele, Valeria Schwarz

Proof reading EN: Emily Hawkins

Translation EN to PT: OPAVIVARÁ! (Brazil)

Graphic design: Stephanie Becker

Public Relations: Lorène Blanche Goesele, Tomma Suki Hinrichsen

This series of talks is supported by the Senate Department for Urban Development, Building and Housing as part of the expansion of the Netzwerkstelle Urbane Praxis, carried out by Urbane Praxis e.V..